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Indígena no Noroeste reclama de falta de apoio no ‘santuário’: “as nossas raízes estão aqui”

No último dia 29 junho, após 13 anos de embates judiciais, a ocupação no Noroeste por indígenas foi reconhecida pela Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) ao delimitar uma reserva de 32,5 hectares para as 6 famílias que ali vivem. No entanto, ainda há falta de serviços para os moradores. Segundo o estudante de direito Fetxa Veríssimo,  habitante e líder jovem do Santuário, não havia contato ou apoio por parte do governo. “Mas há poucos meses foi possível estabelecer um diálogo com a Terracap e outras instituições para firmar a demarcação da terra.”

O Setor Noroeste é um bairro da região administrativa de Brasília, no Distrito Federal. Integra o Plano Piloto de Brasília (região nobre da cidade) e possui uma das maiores rendas per capita da capital; além da privilegiada localização: próximo ao Parque Burle Marx e o Parque Nacional de Brasília (conhecido também como Água mineral). O Setor foi projetado para ser o primeiro bairro ecológico do Brasil.

Apesar da proposta inovadora e da aparente localização privilegiada, a construção do bairro não deixou de ser problemática. Dentro da área estabelecida para o setor havia um povoado indígena, que habitava o local ainda antes da construção de Brasília. O governo optou por dar andamento às obras, iniciando um conflito com os habitantes.

O conflito começou em 2008, quando lotes do setor Noroeste passaram a ser vendidos. Os índios da etnia Fulni ô-Tapuya alegavam que a área seria um santuário; pois além de abrigar um cemitério ancestral, abriga um templo dedicado ao culto da divindade indígena Tupã. “O Santuário é muito mais que só uma área, muito mais que esse espaço onde nós estamos. É algo muito espiritual, as nossas raízes estão aqui. Eu nasci aqui, essa é a minha casa”, afirma Fetxa.

O local serve também para o sustento das aldeias. Além de abrigo, é utilizado pelos habitantes para prática de agricultura, caça e artesanato. “Essa terra nos dá a nossa sobrevivência, e nós cuidamos dela”.

Uma das casas construídas pela comunidade. Foto por Lucas Neiva.

Os impactos

As principais mudanças foram relacionadas à perda de privacidade e de tranquilidade no povoado. A reserva é cercada de prédios altos, de onde os moradores enxergam tudo que acontece nas comunidades. O barulho do tráfego ao redor atrapalha os rituais, segundo o indígena. O jovem acrescentou que a caça e a colheita foram prejudicadas, já que a obra afetou a fauna, a flora e as nascentes locais.

O relacionamento dos moradores com a comunidade é ainda hostil. Os indígenas sofrem preconceitos. Os moradores não procuram conhecer a história ou os motivos para a aldeia estar ali. Alguns nem se dão conta da existência da reserva.

Prédios altos podem ser vistos de qualquer direção dentro da reserva. Foto por Lucas Neiva.

“Como se não existíssemos

As comunidades precisam buscar atendimento da maior parte de suas demandas. Por exemplo, a aldeia só começou a receber energia elétrica em 2014 – uma reivindicação existente há mais de 20 anos. Antes, tinham que fabricar velas e recorrer ao uso de fogueiras. Acesso à água e a construção de um ambulatório indígena também demoraram a chegar, depois de muito esforço.

As demandas por segurança também não são atendidas. Roubos, invasões nas casas e sequestros são frequentes dentro da reserva. Além de casos de violação explícita de privacidade, em que moradores puseram drones para sobrevoar ilegalmente a reserva.

“O governo sabe que nós estamos aqui, mas no olhar deles é como se não existíssemos”, disse Fetxa quando questionado se a aldeia se sente abandonada pelos governantes.

O GDF e a Terracap informaram que aguardam a homologação do acordo firmado com o Instituto Brasília Ambiental, a Fundação Nacional do Índio e o Ministério Público Federal sobre a demarcação de terras para regularizar o fornecimento de energia e água. Os órgãos também informaram que a Polícia Militar patrulha os arredores da reserva das 7h às 23h.

Fetxa Veríssimo, líder jovem da aldeia.

 

Por Ana Botovchenco, Geovana Oliveira e Lucas Neiva

Sob supervisão de Luiz Cláudio Ferreira.