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Recomeço após queimaduras é desafio para o corpo e para as emoções; assista

“Eu não sabia o que doía mais, se eram as queimaduras ou a dor das perdas”. A frase é da professora Vânia Borges, de 50 anos, vítima de queimadura em 2010.  A história é de dor, mas também de superação. “Meu marido segurou nas minhas mãos e falou que essa ia ser a viagem dos sonhos” diz emocionada Vânia Borges de Carvalho ao relembrar as últimas palavras que teve com o marido Jairo, de 43, à época do acidente. Ele e os quatros filhos Rayran, de 16, Anna Beatriz, 12, Pedro, de 9, e Julia, 5, morreram em um acidente automobilístico no dia 22 de dezembro de 2010 na BR-020 rumo a Fortaleza. Como o marido tinha errado o caminho, no momento que ele foi fazer o retorno o carro ficou parado na estrada, foi quando um outro automóvel que tinha um casal mais uma criança colidiu com o da família, ambos os carros entraram em combustão, Vânia foi a única que saiu com vida dos dois carros. “No meio daquele fogo todo, naquele sol muito quente, eu não sabia o que doía mais se eram as queimaduras do meu corpo ou se era a dor das perdas, minhas filhas morreram carbonizadas”.

A professora teve 70% do corpo queimado e ficou 90 dias internada na UTI no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). A equipe médica do hospital decidiu que Vânia não poderia saber da morte dos filhos e do marido por conta do estado grave que se encontrava, apenas quando teve alta recebeu a notícia pela mãe “Ela se aproximou de mim, eu estava na cadeira de rodas e contou que todos já haviam sido sepultados. Nós nos abraçamos e choramos muito. A ficha foi caindo ao poucos”.

Vânia Borges enfrentou uma tragédia familiar e as dores no corpo.

“O sol de amanhã”

Depois de um tempo na casa dos pais, a brasiliense voltou para a residência no Guará, onde morava com toda a família e afirma que o espiritismo (doutrina religiosa) serviu como um incentivador. “Em nenhum momento eu pedi para morrer, mesmo sabendo que ia voltar e não ter mais ninguém. Compreendi que eu tinha uma nova missão”, explica a professora.

Ela voltou também ao trabalho. Neste ano de 2018, ela se aposenta da sala de aula, mas enquanto isso não acontece, Vânia faz palestras motivacionais pela rede Apoio a Perdas Irreparáveis (API) “A gente faz acolhimento a qualquer perda, eu aprendi que quando a gente se dispõe a enxugar uma lágrima, não tem tempo de chorar”. A história de Vânia é contada no livro que lançou em 2016 , Pérolas no Asfalto. “Hoje eu digo que sou uma mulher enxertada, mas de muita fé e coragem”.

“Quem acredita sempre alcança”

Já a estudante Allana Krysna, de 19, soube as consequências da queimadura desde muito nova. Ela se queimou quando tinha apenas um ano. “Estava brincando com o fósforo e risquei na roupa de algodão, o fogo se alastrou rapidamente”. No momento a jovem, que estava acompanhada da babá, foi levada direto para o Hran onde ficou 93 dias internada na UTI  “Os médicos acreditavam que eu não tinha chance de vida”.

Allana quer ser enfermeira para ajudar outras pessoas que passem pelo mesmo problema

A estudante que queimou 47% do corpo afirma que sempre lidou muito bem com essa situação e que qualquer um está sujeito a se queimar “Eu sofri bullying apenas com 9 anos e não aceitei, mostrei para a menina que era normal, nunca tive vergonha, sempre deixei exposta as minhas queimaduras, não vou esconder uma coisa que é uma marca da minha sobrevivência”.  

Hoje em dia, Allana está concluindo o ensino médio e pretende seguir na área de enfermagem, ela acredita que a queimadura é um assunto pouco comentado nas mídias “Eu conheço tantas histórias de pessoas que se queimaram por acidentes bobos e não se tem um alerta para isso, tenho propostas e já falei com alguns médicos para darem mais ênfase sobre a prevenção”.

“Confie em si mesmo”

De acordo com dados do Ministério da Saúde, um milhão de pessoas sofrem queimaduras no Brasil por ano, crianças e a população de baixa renda estão entre as maiores vítimas.  No caso do hoje estudante de engenharia Eliseu Egewarth, de 23, mato-grossense, um acaso provocou a mudança repentina de vida. Quando tinha 10 anos de idade, ele foi acenar para o irmão, encostou na janela onde havia uma fiação elétrica muito próxima que atraiu o braço e tomou uma descarga de 9 mil volts. “Como a nossa cidade não tinha um hospital grande e a minha situação era grave, tive que vir para Brasília e logo no início da internação já fiz a cirurgia de amputação do braço”.

Eliseu, com 10 anos, idade em que sofreu o acidente
Hoje, Eliseu cursa engenharia e sonha com a própria empresa. Foto: Maria Fernanda Suassuna

Não foram apenas essas sequelas, o estudante também teve que extrair um dedo do pé, além das cicatrizes na perna e na barriga, porém ele não quis usar a prótese “ Ela acaba trazendo mais incômodo do que praticidade, para  algumas atividades eu tenho um pouco de dificuldade, mas eu peço ajuda às pessoas.

O rapaz sempre teve apoio da família e dos amigos. “Eu consegui me adaptar fácil,  sempre tive facilidade de fazer amizades e a intenção dos meus pais quando quiseram que continuasse na escola na época do tratamento, era buscar me incluir socialmente”. Para o futuro, Eliseu pretende abrir uma empresa de tecnologia com irmão que também faz faculdade de engenharia de software.

Por Maria Fernanda Suassuna

Fotos: Arquivo Pessoal